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            1.2.1  Primeira chaga – A imaturidade dos projetos: decisões rápidas,
                   sofrimento lento


                         A imaturidade dos projetos se revela como um dos   A imaturidade leva a uma priorização de projetos
                   principais obstáculos ao sucesso dos investimentos em   precária com consequente má alocação dos escassos
                   infraestrutura, prejudicando a seleção e a priorização racio-  recursos em infraestrutura. Não raramente, megaprojetos
                   nais dos projetos de infraestrutura brasileiros. A imatu-  de dezenas de bilhões de reais são escolhidos e priorizados
                   ridade nada mais é do que tomar uma decisão quando   com base em argumentos de autoridade e não na autori-
                   ainda não se tem os elementos mínimos para subsidiar   dade dos argumentos. É comum ouvir, por exemplo, que a
                   uma tomada de decisão informada e consciente. Decisões   construção de uma dada ferrovia gerará desenvolvimento e
                                                                                   16
                   imaturas, baseadas em aparência, preconcepções e pouco   empregos numa região . Contudo, esses benefícios poucas
                   tempo para refletir, resultam em problemas em qualquer   vezes são, de fato, monetizados e comparados com os custos
                   área, desde casamentos que terminam em poucos meses   do projeto ou mesmo com alternativas de investimento que
                   e negócios que fecham suas portas até projetos bilionários   poderiam atender à necessidade da população.
                   que culminam em estruturas inacabadas.


                   1.2.1.1  Falhas de priorização, imaturidade e pressões de curto prazo

                         As falhas de priorização de investimentos que   no trabalho intitulado “Political budget cycles in new versus
                   implicam má alocação de recursos têm sido apontadas   established democracies” (BRENDER e DRAZEN, 2005).
                   como um dos principais problemas brasileiros, conforme
                   indicam entidades multilaterais. O Fundo Monetário Inter-  Esse fenômeno é definido pela expressão “ciclo
                   nacional constatou que os problemas mais críticos nos   orçamentário político”. De acordo com Brender e Drazen
                   investimentos em infraestrutura brasileiros estão ligados   (ibid.), tal “manipulação fiscal pode funcionar porque
                   às falhas de priorização estratégica e avaliação e seleção   os eleitores são inexperientes com a política eleitoral ou
                   de projetos (FMI, 2018). O Banco Mundial (2018) e a OCDE   porque podem simplesmente não ter a informação neces-
                   (2022) também fizeram críticas à falta de coerência do   sária para avaliar a manipulação fiscal que é produzida
                   planejamento brasileiro.                        em democracias mais estabelecidas” (p. 3, grifos nossos).
                                                                   Rose-Ackerman e Palifka (2016) destacam que “o custo
                         Entre os vários motivos para a imaturidade e a   social em termos de maiores impostos e ônus da dívida
                   consequente falha na priorização, pode se destacar as   pode não ser óbvio para os eleitores que veem apenas a
                   pressões de curto prazo associadas muitas vezes ao curto   nova infraestrutura”. Já nas democracias desenvolvidas,
                   ciclo eleitoral, o que afeta as decisões de governo, que   os eleitores têm maior capacidade de identificar a manipu-
                   acabam por desconsiderar a infraestrutura como papel do   lação fiscal e repudiar tal comportamento, desincentivando
                   Estado. Muitas vezes, o impulso para atender às demandas   seu uso pelos políticos.
                   eleitorais incentiva os gestores a negligenciar a fase crucial
                   de planejamento. Essa falta de diligência resulta em lacunas   Os professores James E. Alt, da Universidade
                   na compreensão do projeto, aumentando as chances de   de Harvard, e David Dreyer Lassen, da Universidade de
                   problemas sérios emergirem ao longo do caminho.  Copenhagen, publicaram um artigo interessante (2006)
                                                                   que explica como o déficit do gasto público varia antes e
                         O senso comum de que governantes em exercício   depois das eleições em países com alto e baixo grau de
                   tendem a usar políticas econômicas expansionistas antes das   transparência. Com base em modelagens econométricas,
                   eleições para aumentar suas chances de reeleição é também   eles demonstraram que a transparência é um fator crucial
                   suportado por análises econométricas, sendo que isso é mais   que distingue esses dois grupos de países. Nos países
                   frequentemente constatado em países em desenvolvimento   com alta transparência, não há variação do nível de déficit
                   do que em nações desenvolvidas, conforme demonstrado   antes e depois das eleições. Ou seja, os governantes não



                   16  A promessa de geração maciça de empregos, principalmente em obras lineares de infraestrutura, só se materializa durante a construção. Uma ferrovia, por exemplo,
                     emprega milhares de operários durante sua execução, mas assim que a obra acaba, os trabalhadores são demitidos.





                                         O iceberg da infraestrutura: cOmO cOmbater a imaturidade, a inviabilidade e a paralisaçãO de Obras brasileiras
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