Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas

Fiscobras: Superfaturamento, projeto básico ineficiente e falhas orçamentárias são as maiores irregularidades em obras

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Três irregularidades se destacaram no relatório anual de consolidação das fiscalizações de obras Tribunal de Contas da União (TCU), o Fiscobras 2018: são elas “Sobrepreço/Superfaturamento” (1.331 achados); “Projeto básico deficiente, inexistente ou desatualizado” (1.158 achados); e “Falhas na composição de custos expressos na planilha orçamentária” (749 achados). Os dados foram retirados de um universo de 1.688 fiscalizações realizadas durante um período de 10 anos.

Além dessas três principais irregularidades, foram identificados outras, tais como “Descumprimento no cronograma (518 achados); “Restrição à competitividades”(498 achados); “Fiscalização contratual inexistente” (483 achados) e Aditivos irregulares”(422 achados). Veja lista completa com os principais achados de auditoria consolidados no gráfico abaixo:

Segundo o relatório, as principais causas de irregularidades em obras públicas no país estão relacionadas à etapa de elaboração dos projetos de engenharia. Os números apontam para a ocorrência de problemas de natureza sistêmica na área de obras públicas e que se perdura ao longo dos anos. “O estudo de viabilidade técnica-econômica precede a elaboração dos projetos. Inexistindo esse estudo, ou havendo deficiência nessa parte, todas as etapas posteriores encontram-se prejudicadas”, alerta..

Para a melhoria da qualidade das obras públicas no país, três sugestões foram feitas pelo TCU: 1) obrigatoriedade de estudo de viabilidade técnico-econômica anterior ao lançamento do edital de concorrência, descartando-se obras que não contribuam para o desenvolvimento do país; 2) obrigatoriedade de projeto executivo de engenharia antes da licitação do projeto, permitindo a elaboração de orçamentos realistas e evitando-se assim previsões inexequíveis que causem má qualidade na execução, atrasos, rescisões ou a combinação de todos estes fatores; e 3) obrigatoriedade de obtenção prévia de licenças ambientais, evitando-se contestações judiciais ao longo da execução do projeto e o início de obras que estejam em desacordo com a legislação;.

“Há tempos o Instituto Brasileiro de Auditoria de Obras Públicas alerta para a falta de planejamento das obras públicas brasileiras e esse relatório do Fiscobras vem a confirmar o que já sabíamos: projetos básicos inexistentes ou ineficientes resultam em obras caras e com baixa qualidade, que eventualmente acabam paralisadas ou tendo que ser refeitas”, concluiu o presidente do Ibraop, Pedro Jorge Rocha de Oliveira.

Confira a íntegra do Fiscobras 2018, presente no AC 2461 do TCU:

2. No painel de obras públicas do Fiscobras, em um universo de 1.688 fiscalizações realizadas durante um período de 10 anos, verifica-se que as três principais ocorrências são: “Sobrepreço/Superfaturamento” com 1.331 achados; “Projeto básico deficiente, inexistente ou desatualizado”, com 1.158 achados; e “Falhas na composição de custos expressos na planilha orçamentária” com 751 achados. O Gráfico 8, a seguir, mostra os principais achados consolidados.

3. O montante de verificações nas três principais tipologias de irregularidades, ligados diretamente ao projeto ou à planilha orçamentária dele integrante, nos mostra que as obras públicas brasileiras apresentam uma deficiência estrutural na fase anterior ao início da sua implementação/execução, ou seja, na etapa de estudos e planejamento (Elaboração do Projeto).

4. Segundo o Conselho Federal de Engenharia e Agronomia (CONFEA), a definição de Projeto é a “representação gráfica ou escrita necessária à materialização de uma obra ou instalação, realizada através de princípios técnicos, arquitetônicos ou científicos, visando à consecução de um objetivo ou meta, adequando-se aos recursos disponíveis e às alternativas que conduzem à viabilidade da decisão” (grifo acrescentados, fonte: http://normativos.confea.org.br/downloads/1073-16.pdf).

5. A respeito de projetos deficientes, Valmir Campelo e Rafael Jardim, no Livro “Obras públicas – Comentários à jurisprudência do TCU”, 3ª edição, p. 514 traz o seguinte comentário:

5.1.Projetos básicos mal elaborados, desatualizados e que deixem dúvidas quanto às exatas condições do objeto, geram riscos, que inevitavelmente serão incluídos nas propostas dos concorrentes. Além dessa antieconomicidade intrínseca, existe uma imponderação acerca da própria exequibilidade do certame.

5.2.Pior ainda se previrem especificações destoantes da realidade. As propostas serão ofertadas para um objeto inexistente e a obra executada será tão distinta da licitada que pode representar fuga ao procedimento licitatório. Abre-se espaço para uma série de termos aditivos a desvirtuar as condições iniciais avençadas. É a porta para a ocorrência de uma gama de irregularidades, como a extrapolação dos limites legais de 25% (ou 50%, conforme o caso) e o “jogo de planilhas”.

6. Dessa forma, o montante de achados relacionados à deficiência nos projetos/orçamentos nas diversas fiscalizações realizadas pelo Tribunal, apontam para a ocorrência de problemas de natureza sistêmica na área de obras públicas e que se perdura ao longo dos anos.

7. Em decorrência dos dados apresentados, propõe-se uma reflexão sobre essa problemática que envolve essas falhas e deficiências na elaboração do projeto/orçamento no atual modelo de contratação de obras públicas. Para isso, apresenta-se referências técnicas da engenharia consultiva e entidades no sentido de subsidiar o entendimento e avaliação da problemática.

8. Segundo João Alberto Viol (Presidente do Sinaenco – Sindicato Nacional das Empresas de Arquitetura e Engenharia Consultiva fonte: https://www.aecweb.com.br/cont/a/contratacao-por-projeto-executivo-define-a-obra_7297), nos países desenvolvidos (EUA, Europa e Ásia), para contratação de uma obra pública utiliza-se o projeto executivo completo. Nesses países, chega-se “a despender até cinco anos no planejamento e no desenvolvimento de um projeto de qualidade. Com base nesses projetos completos, contrata-se a construtora ou consórcio que fará a obra. Assim, conseguem na maioria das vezes concluir seus empreendimentos em prazos mais curtos e pelo custo previsto”.

9. Outro autor, arquiteto e urbanista Sérgio Magalhães, defendeu e” artigo publicado no jornal “O Globo” o compromisso de os governos licitarem obras públicas somente a partir do projeto executivo completo. Será, em sua opinião, o primeiro passo “para revogar a licenciosidade chamada ‘projeto básico’, isto é, projeto incompleto, que tantos desastres (e mortes) tem causado. Obra se contrata com projeto completo”. (Fonte: http://portalclubedeengenharia.org.br/2016/06/24/primeiro-passo-por-sergio-magalhaes/)

10.Segundo Lucas Ribeiro Horta (presidente do Sinaenco/MG), em artigo técnico (fonte: http://sinaenco.com.br/noticias/eficiencia-comeca-na-contratacao-de-bons-projetos/) argumenta que:

“No caso das obras públicas, muito tempo é perdido em função de não serem pensadas com antecedência. “É notório o pouco esforço que costuma ser dedicado no Brasil às fases de planejamento. Em alguns países, como Alemanha e Japão, por exemplo, a fase de planejamento chega a demorar até a metade do tempo total do prazo de execução da obra. Se compararmos com o Brasil, normalmente, só um quinto do tempo é dedicado às etapas iniciais. No Brasil, muitas obras podem ser iniciadas apenas com um projeto básico. Sem detalhamento, é normal que surjam situações não previstas, exigindo mudanças no cronograma e mais dinheiro para a execução. Por isso, muitas obras não vão para a frente e precisam sofrer modificações por causa da demora na execução e pouca dedicação ao planejamento”.

11.Outro elemento interessante para essa discussão é o pedido de desculpas públicas feito por uma empresa (Andrade Gutierrez), após o acordo de leniência homologado pelo Juiz Sérgio Moro, no âmbito da operação lava jato, que foi publicado nos maiores jornais do país no ano de 2016. (Fonte: http://agenciabrasil.ebc.com.br/politica/noticia/2016-05/andrade-gutierrez-publica-pedido-de-desculpas-ao-povo-brasileiro ).

12.Em síntese, nesse pedido de desculpas, a empresa reconhece publicamente os erros/desvios que foram cometidos nas obras públicas, apresenta o compromisso de pagamento de indenização no valor de R$ 1 bilhão de reais, informa que está sendo implementado um modelo de Compliance na empresa com as melhores práticas, reconhece o trabalho do Judiciário e Ministério Público da União (MPU), bem como o resultado desse trabalho para aprimorar os mecanismos legais anticorrupção e a evitar o desperdício de dinheiro público e combater a impunidade existente. Nele ainda é apresentado um conjunto de 8 propostas para criar uma nova relação entre o poder público e as empresas nacionais, dentre as quais destacam-se as apresentadas a seguir.

13.Propostas para um Brasil melhor:

13.1.obrigatoriedade de estudo de viabilidade técnico-econômica anterior ao lançamento do edital de concorrência, descartando-se obras que não contribuam para o desenvolvimento do país;

13.2.obrigatoriedade de projeto executivo de engenharia antes da licitação do projeto, permitindo a elaboração de orçamentos realistas e evitando-se assim previsões inexequíveis que causem má qualidade na execução, atrasos, rescisões ou a combinação de todos estes fatores;

13.3.obrigatoriedade de obtenção prévia de licenças ambientais, evitando-se contestações judiciais ao longo da execução do projeto e o início de obras que estejam em desacordo com a legislação; (grifos acrescidos)

14.Ou seja, na opinião da aludida empresa, as principais causas de irregularidades em obras públicas no país estão relacionadas à etapa de elaboração dos projetos de engenharia, seja (i) no estudo de viabilidade técnico-econômica; (ii) na confecção prévia do projeto executivo; e (iii) adequação dos projetos aos ditames dos órgãos de controle ambiental.

15.O estudo de viabilidade técnica-econômica precede a elaboração dos projetos. Inexistindo esse estudo, ou havendo deficiência nessa parte, todas as etapas posteriores encontram-se prejudicadas. Porém, os dados do Fiscobras apontam para a existência de obras relevantes para o país que estão sendo realizadas sem esse estudo.

16.Assim, não restam comprovados (i) a necessidade do empreendimento; (ii) a utilidade dos investimentos para a sociedade; (iii) o potencial retorno socioeconômico; (iv) e a viabilidade de manutenção/operação no pós-obra. Cita-se, aqui, exemplos de obras nessa situação presentes nesse relatório do Fiscobras e classificadas como IGP, tais como: BRT de Palmas (Acórdão 460/2017-TCU-Plenário, relator Min. André de Carvalho) e Implantação da Vila Olímpica de Parnaíba (Acórdão 2.394/2013-TCU-Plenário, relator Min. André de Carvalho).

17.Quanto a elaboração prévia de projeto executivo que permitiria a “realização de orçamentos realísticos”, alude-se essa questão/problema é confirmada na quantidade de achados das fiscalizações do Fiscobras (Sobrepreço/superfaturamento e Falhas nas composições de custos), fielmente retratada no gráfico retrocitado, bem como sobrepreços/superfaturamentos e falhas nas composições são decorrentes de projetos/orçamentos deficientes.

18.Além disso, nessa segunda sugestão, existe uma situação de causa-efeito quando se utiliza projetos deficientes resultando em orçamentos deficientes e que ocasionam “previsões inexequíveis que causem má qualidade na execução, atrasos, rescisões ou a combinação de todos estes fatores”. Tais fatos também são confirmados nos demais achados presentes no gráfico (descumprimento do cronograma físico, aditivos irregulares, outras irregularidades na execução e objeto entregue com qualidade deficiente).

Fonte: Coinfra/Siob

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